O financiamento das universidades estaduais paulistas é realizado via repasse de 9,57% da Quota-parte Estado (QPE) do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) [1] arrecadado no estado de São Paulo. A QPE, por sua vez, equivale a 75% do ICMS total arrecadado, enquanto os outros 25% são destinados aos municípios, o chamado ICMS-QPM; e da QPE, 5,0295% são destinados para a USP, 2,3447% para a Unesp e 2,1958% para a Unicamp [2] [3]. Mas há muito a se comentar sobre isso.

  • De onde vem esse número de 9,57%?

Em 2 de fevereiro de 1989, Orestes Quércia (PMDB), então governador do estado de São Paulo, assina o Decreto Nº 29.598, que “dispõe sobre providências visando a autonomia Universitária” [4]. Neste momento é decretada legalmente a autonomia didático-científica, administrativa e de gestão patrimonial e financeira das universidades estaduais, e fica fixado o financiamento das mesmas por repasse de ICMS-QPE — de 8,4%. O prof. Paulo Renato, reitor da Unicamp na época, calculou que o recebido pelas universidades era correspondente a 11,6% do ICMS-QPE, e que portanto o decreto dificultava o sustento das estaduais paulistas. Desde então, o repasse foi aumentado pela Assembleia Legislativa para 9% em 1992 e desde 1995 estamos estacionados nos 9,57%, estagnado apesar de crescer o número de campi e de quase dobrar o número de alunos em graduação e pós-graduação [5]. Há décadas o Fórum das Seis — entidade composta por associações de docentes, por sindicatos e por entidades discentes das três estaduais paulistas — luta pelo aumento para 11,6%.

  • Os 9,57% são repassados?

Não. Antes de ser calculado o total do ICMS, para então serem divididas as parcelas que serão repassadas às universidades, são feitos inúmeros descontos para artificialmente diminuir o total arrecadado, e além disso o governo do estado repassa gastos indevidos para as administrações das universidades.

O governo desconta (ou seja, não contabiliza) do cálculo do ICMS-QPE recursos destinados a programas de habitação, multas, juros de mora e dívida ativa. Só esses descontos retiraram da base de cálculo R$9,2 bilhões entre 2014 e 2016, o que resultou numa perda de aproximadamente R$1 bilhão para as universidades estaduais paulistas em dois anos [5].

Outro gasto indevidamente repassado pelo governo do estado é o da insuficiência financeira. Foi criado o São Paulo Previdência (SPPREV) em 2007 com a aprovação da Lei Complementar nº 1.010/2007 [6], que deixa em responsabilidade do estado a cobertura de eventuais insuficiências financeiras, e ainda se explica que insuficiência está sendo entendido como “o valor resultante da diferença entre o valor total da folha de pagamento dos benefícios previdenciários e o valor total das contribuições previdenciárias dos servidores, dos Poderes, entidades autônomas e órgãos autônomos do Estado”. Por uma interpretação por parte do governo de que as universidades fazem parte do estado, o gasto com insuficiência financeira atualmente corresponde a quase 20% dos recursos repassados para a universidade [5] [7]. Também com a criação do SPPREV fica sob responsabilidade das universidades cobrir os custos de aposentadorias e previdência dos funcionários, e só em 2016 na Unicamp o pagamento de pensionistas consumiu cerca de 2,7% dos repasses [7].

Além de tudo isso, vale mencionar o acordo assinado entre a administração da Unicamp e o governo do estado, que prometia um aumento em 0,05% do repasse de ICMS-QPE para a universidade por conta da criação da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) e da Faculdade de Tecnologia (FT) em Limeira [8]. O aumento combinado há 13 anos nunca foi cumprido.

  • Impacto na vida dos trabalhadores

São inúmeras as irregularidades legais e deficiências políticas por parte do estado e da própria Unicamp que levam à crise de financiamento que vemos, e lidando com o déficit proveniente de todos esses problemas citados anteriormente, a reitoria decide cortar das políticas de permanência [9] dos alunos e não reajustar os salários dos trabalhadores, entre outras diversas medidas prejudiciais ao funcionamento da universidade. Logo, se pretendemos discutir o seu financiamento, vale mencionar as pautas da greve do Sindicato dos Trabalhadores da Unicamp (STU), que abordaremos no texto da próxima terça-feira.

 

Referências

[1] – https://portal.fazenda.sp.gov.br/servicos/isencao-icms-veiculos/Paginas/Sobre.aspx

[2] – http://www.unicamp.br/unicamp/noticias/2016/05/23/comunidade-universitaria

[3] – https://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2105200003.htm

[4] – https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/decreto/1989/decreto-29598-02.02.1989.html

[5] – http://www.adusp.org.br/files/database/2017/forum/PropF6LDO2018.pdf

[6] – http://www.legislacao.sp.gov.br/legislacao/dg280202.nsf/6279925b177ee40183256b6f00692f13/894c6d86f3f517dd032572f000529157

[7] – http://www.adunesp.org.br/atx/arquivos/gtprevidencia.pdf

[8] – http://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2014/08/unicamp-cobra-aumento-de-repasse-acordado-ha-nove-anos-com-o-estado.html

[9] – http://www.cal.iel.unicamp.br/?p=456